- I would rather be ashes than dust!
- I would rather that my spark should burn out in a brilliant blaze than it should be stifled by dry-rot.
- I would rather be a superb meteor, every atom of me in magnificent glow, than a sleepy and permanent planet.
- The function of man is to live, not to exist.
- I shall not waste my days trying to prolong them.
- I shall use my time.
sábado, julho 01, 2006
Interlúdio. Ponto de Situação.
quarta-feira, maio 03, 2006
Dublin, what a city!
Portanto, eu tenho de há muito esta empatia com tudo o que é celta, uma certa congenialidade espiritual com aquele sentir as coisas que W.B. Yeats foi buscar aos antepassados para pôr na sua poesia, e tinha de ir à Irlanda. Fui.
E lá me fui tentar entranhar como podia na cidade de Dublin (e só Dublin porque para o resto era curto o fim-de-semana) e na maneira de viver daquela gente que acabei por descobrir ser mais do que se possa pensar, de simpatia autêntica e afabilidade genuína que dá vontade de trazer um irlandês para ter em casa, como se fosse um Leprechaun.
Calhou, ainda por cima, no fim de semana em que passavam 90 anos sobre a Revolta da Páscoa, rebelião patriótica esmagada pelos britânicos que lançou a independência da Irlanda. Não que houvesse muito assinalado, para além de uns cartazes (o centenário de Beckett estava mais presente), mas para mim esse ambiente temporal conta.
Lá fui à procura da cidade de rebelião política, da cidade literária de Joyce, Yeats e Wilde. Estava lá tudo à minha espera.
Aqui vai poder-se ver, aos poucos, o que por lá há.
E lá me fui tentar entranhar como podia na cidade de Dublin (e só Dublin porque para o resto era curto o fim-de-semana) e na maneira de viver daquela gente que acabei por descobrir ser mais do que se possa pensar, de simpatia autêntica e afabilidade genuína que dá vontade de trazer um irlandês para ter em casa, como se fosse um Leprechaun.
Calhou, ainda por cima, no fim de semana em que passavam 90 anos sobre a Revolta da Páscoa, rebelião patriótica esmagada pelos britânicos que lançou a independência da Irlanda. Não que houvesse muito assinalado, para além de uns cartazes (o centenário de Beckett estava mais presente), mas para mim esse ambiente temporal conta.
Lá fui à procura da cidade de rebelião política, da cidade literária de Joyce, Yeats e Wilde. Estava lá tudo à minha espera.
Aqui vai poder-se ver, aos poucos, o que por lá há.
terça-feira, abril 25, 2006
A Revolução que tanto amamos
Foi na sequência da Ávinho em Aveiras. Desafiei os escuteiros que ficaram este ano com a taberna do Chico da Serra. Aceitaram prolongar a festa do vinho e das adegas por mais um dia para além do fim de semana e comemorar o 25 de Abril à segunda-feira. O 25.
Não houve imposição de escolha musical, não houve nada. Apenas uma sugestão bem acolhida. Eu nem gosto do escutismo, só destes escuteiros de quem sou amigo.
Foi bonita a festa, pá!
Cartazes do 25 e música do Zeca. Discussão política com todos os pontos de vista representados - ou melhor, possibilidade de discutir tudo e mais qualquer coisa.
As cabeças estavam alertas e dispostas a debater e discutir. Não sei se por teimosia ou por disposição, mas sei que o tema desta festa abriu muitas portas. E o 25 de Abril aconteceu. A bem ou a mal, a discussão aconteceu. O que era bom, o que era mau, tudo isso apareceu. A política como está, como devia ser, apareceu. Os conflitos surgiram, o diálogo proporcionou-se, e à razão deixou-se o lugar devido.
Disse, pois disse. E ainda bem que há democracia, nem que seja à volta de um copo de cerveja ou vinho.
Depois de vir a casa deixar os posters que serviram de decoração ao espaço da taberna do Chico da Serra, senti que havia alguma coisa a dizer, e que não era por estar ébrio que deixaria de o dizer. E por isso voltei. Disse-o. O 25 fez-se por uma sociedade idealizada que não pode conhecer limites de classe ou posição social. O 25 fez-se para que haja liherdade e tolerância. Ainda bem que a liberdade fala pelas mais estranhas formas. Só assim pode o 25 acontecer nas pequenas coisas. Sem atavios ou prisões. Só a liberdade. Hoje o 25 aconteceu. A mensagem passou, e eu, um pequeno elemento na correia de transmissão, deixarei e farei com que aconteça todos os dias. Que bela forma de homenagear a geração dos meus pais! Que belo presente é a liberdade!
Não houve imposição de escolha musical, não houve nada. Apenas uma sugestão bem acolhida. Eu nem gosto do escutismo, só destes escuteiros de quem sou amigo.
Foi bonita a festa, pá!
Cartazes do 25 e música do Zeca. Discussão política com todos os pontos de vista representados - ou melhor, possibilidade de discutir tudo e mais qualquer coisa.
As cabeças estavam alertas e dispostas a debater e discutir. Não sei se por teimosia ou por disposição, mas sei que o tema desta festa abriu muitas portas. E o 25 de Abril aconteceu. A bem ou a mal, a discussão aconteceu. O que era bom, o que era mau, tudo isso apareceu. A política como está, como devia ser, apareceu. Os conflitos surgiram, o diálogo proporcionou-se, e à razão deixou-se o lugar devido.
Disse, pois disse. E ainda bem que há democracia, nem que seja à volta de um copo de cerveja ou vinho.
Depois de vir a casa deixar os posters que serviram de decoração ao espaço da taberna do Chico da Serra, senti que havia alguma coisa a dizer, e que não era por estar ébrio que deixaria de o dizer. E por isso voltei. Disse-o. O 25 fez-se por uma sociedade idealizada que não pode conhecer limites de classe ou posição social. O 25 fez-se para que haja liherdade e tolerância. Ainda bem que a liberdade fala pelas mais estranhas formas. Só assim pode o 25 acontecer nas pequenas coisas. Sem atavios ou prisões. Só a liberdade. Hoje o 25 aconteceu. A mensagem passou, e eu, um pequeno elemento na correia de transmissão, deixarei e farei com que aconteça todos os dias. Que bela forma de homenagear a geração dos meus pais! Que belo presente é a liberdade!
terça-feira, abril 11, 2006
Dia de Anos
Com que então caiu na asneira
De fazer na quinta-feira
Vinte e seis anos! Que tolo!
Ainda se os desfizesse...
Mas fazê-los não parece
De quem tem muito miolo!
Não sei quem foi que me disse
Que fez a mesma tolice
Aqui o ano passado...
Agora o que vem, aposto,
Como lhe tomou o gosto,
Que faz o mesmo? Coitado!
Não faça tal: porque os anos
Que nos trazem? Desenganos
Que fazem a gente velho:
Faça outra coisa: que em suma
Não fazer coisa nenhuma,
Também lhe não aconselho.
Mas anos, não caia nessa!
Olhe que a gente começa
Às vezes por brincadeira,
Mas depois se se habitua,
Já não tem vontade sua,
E fá-los queira ou não queira!
João de Deus
quinta-feira, abril 06, 2006
quarta-feira, março 08, 2006
Dois porta-aviões ao fundo
Agora sim, podemos gritar à vontade. E começar a acreditar que, feito mais do que a nossa obrigação ao chegarmos até aqui, há-de ser sempre a aviar fruta. Isso é o que ser Benfiquista tem de bonito - qual realismo, qual quê, um bom benfiquista quer-se fanfarrão.
Já estou a ver o trambolho do Beto a fugir pelo campo fora, agarrado à taça, na final do Stade de France, e a brasileirada a rezar ao orixá de cada um, com o Koeman ao fundo a ser rebolado pelo relvado fora por uma multidão de emigrantes portugueses, que assistia ao jogo no exterior do estádio e forçou as barreiras, celebrando o feito com uma expressiva, mas pacífica, invasão de campo, enquanto os Champs Elisées são ocupados e reivindicados como região autónoma de Portugal por uma noite. Ah, o sonho, o delírio!
Batam lá isto em fanfarronice.
Já estou a ver o trambolho do Beto a fugir pelo campo fora, agarrado à taça, na final do Stade de France, e a brasileirada a rezar ao orixá de cada um, com o Koeman ao fundo a ser rebolado pelo relvado fora por uma multidão de emigrantes portugueses, que assistia ao jogo no exterior do estádio e forçou as barreiras, celebrando o feito com uma expressiva, mas pacífica, invasão de campo, enquanto os Champs Elisées são ocupados e reivindicados como região autónoma de Portugal por uma noite. Ah, o sonho, o delírio!
Batam lá isto em fanfarronice.
segunda-feira, março 06, 2006
Orgulha-te, pá!
Bonita a festa de ontem dos Oscars. Valeu a pena ficar acordado para ver Jon Stewart a apresentar uma cerimónia politicamente comprometida, (e comprometida para o meu lado, ainda melhor) com um discurso de George Clooney de que não resisto a transcrever um trecho:
"Diria que de vez em quando em Hollywood andamos um pouco desajustados. Acho que provavelmente é bom. Fomos nós que falámos de SIDA quando o assunto apenas é murmurado, e falámos de direitos civis quando isso não era popular. E trazemos os assuntos ao de cima. Esta Academia, este grupo de pessoas deram um Oscar a Hattie McDaniel em 1939 quando os negros ainda tinham de se sentar nas últimas filas dos cinemas. Tenho orgulho em pertencer a esta Academia. Orgulho em fazer parte desta comunidade, e orgulho em estar desajustado."
"Diria que de vez em quando em Hollywood andamos um pouco desajustados. Acho que provavelmente é bom. Fomos nós que falámos de SIDA quando o assunto apenas é murmurado, e falámos de direitos civis quando isso não era popular. E trazemos os assuntos ao de cima. Esta Academia, este grupo de pessoas deram um Oscar a Hattie McDaniel em 1939 quando os negros ainda tinham de se sentar nas últimas filas dos cinemas. Tenho orgulho em pertencer a esta Academia. Orgulho em fazer parte desta comunidade, e orgulho em estar desajustado."
quarta-feira, fevereiro 22, 2006
Como é que se extravasa a alegria...
segunda-feira, fevereiro 13, 2006
A cavalo nas ondas
Depois da neve - não tão rapidamente como a sucessão de posts pode dar a entender - a praia, e o surf na baía do Baleal. Não me interessa a tribo que está por trás do surf ou o estereótipo de surfista-gajo-fora-da-realidade, até porque não sou dado a estereótipos, e os meus companheiros de ondas não são assim. Não me interessa o modo de vida despreocupado, por muito aliciante que seja. Interessa-me o surf, não o surfismo.
O que me alicia é aquela vertigem de velocidade quando se desce a onda, com os olhos a rasar a água e o nariz cheio de sal, antes de nos levantarmos, e depois experimentar a brevíssima sensação de domínio absoluto nos segundos que conseguimos ficar de pé em cima da prancha, como se caminhássemos por cima da água, como Jesus na Galileia.
É encarar o mar monumental e não se importar com a nossa própria insignificância, entrar sem medo mas com respeito, pormo-nos em bicos de pés para agarrar um poucochinho de infinito.
Ah, a vida...
O que me alicia é aquela vertigem de velocidade quando se desce a onda, com os olhos a rasar a água e o nariz cheio de sal, antes de nos levantarmos, e depois experimentar a brevíssima sensação de domínio absoluto nos segundos que conseguimos ficar de pé em cima da prancha, como se caminhássemos por cima da água, como Jesus na Galileia.
É encarar o mar monumental e não se importar com a nossa própria insignificância, entrar sem medo mas com respeito, pormo-nos em bicos de pés para agarrar um poucochinho de infinito.
Ah, a vida...
domingo, janeiro 29, 2006
Neve
segunda-feira, janeiro 23, 2006
Foi bonita a festa, pá!
Pouco passava das sete e meia da noite quando saí de casa para saber os resultados. Mal dobrei a esquina dei com um conterrâneo que descia a rua de bicicleta, em sentido contrário. «O Manel ganhou! O Manel ganhou!». Parei. Depois corri à maluca para a Assembleia de Voto para confirmar. Era verdade. E enquanto passava os resultados para o caderno onde registo a minha vida, comecei a estremecer de emoção. No meio da derrota que se adivinhava esta era uma consolação: Aveiras era Alegre. E assim também foram Vale do Paraíso e Vila Nova de S. Pedro.
Depois vieram as projecções. Pronto, lá ia conceder e ter de levar com o triunfalismo dos desbocados da direita.
Mas não. Cavaco aguentou-se à primeira, mas a marcha do apuramento de resultados ia-lhe corroendo progressivamente a vitória. O Manel ficou a seis décimas da segunda, e não usou o bom resultado para esfregar no nariz do partido.
Há derrotas saborosas, e esta foi uma dessas.
A julgar pelas derrotas saborosas que tenho tido, diria que estou quase a ganhar alguma coisa.
Depois vieram as projecções. Pronto, lá ia conceder e ter de levar com o triunfalismo dos desbocados da direita.
Mas não. Cavaco aguentou-se à primeira, mas a marcha do apuramento de resultados ia-lhe corroendo progressivamente a vitória. O Manel ficou a seis décimas da segunda, e não usou o bom resultado para esfregar no nariz do partido.
Há derrotas saborosas, e esta foi uma dessas.
A julgar pelas derrotas saborosas que tenho tido, diria que estou quase a ganhar alguma coisa.
sexta-feira, janeiro 20, 2006
Acreditar até ao fim
Ontem estive no Pavilhão Atlântico. Não eramos vinte mil, mas também não tínhamos autocarros para nos trazer, nem andámos a arregimentar rebanhos para lá ir, como diz o candidato. Quem lá foi, foi porque tinha vontade de ir, não porque calhava.
A campanha de Manuel Alegre teve sempre esta tónica: quem apareceu, apareceu com uma enorme vontade. Quem apareceu fê-lo por amor à liberdade, e não porque tinha de fazer o frete ao partido. Esta vontade que move montanhas através de gestos simples é uma força muito poderosa que dará resultados no Domingo. É nisso que acredito, contra os que desanimam e se conformam com a coroação há muito anunciada.
Acredito na passagem à segunda volta por muitas razões.
Porque há muita gente indecisa que pode a todo o momento descair para o nosso lado. Porque nesse momento solitário e secreto em que se entra na cabine de voto e pomos o papel à nossa frente muita coisa nos passa pela cabeça. Porque nesse momento em que ninguém está a ver somos integralmente livres. Porque aí não há confusão possível entre quem achamos que vai ganhar, quem achamos que pode ganhar e quem queremos que ganhe, e a nossa vontade é soberana. E por último, porque em última análise a capacidade de sonhar e rasgar horizontes vale mais do que a capacidade de fazer contas, a vontade de ganhar vale mais do que a vontade de mandar. Merece mais ganhar aquele que luta do que aquele que acha que o lugar lhe está destinado.
No domínio da possibilidade, as probabilidades estão repartidas: a vitória de Cavaco à primeira volta é provável, mas a segunda volta também o é. Não é só um delírio visionário, é uma possibilidade cada vez mais concreta.
Aos que me chamam utópico respondo que essa é a única maneira de que vale a pena viver a vida. A utopia não é o irrealizável, é o que ainda não está realizado. A utopia é esse horizonte em movimento em direcção ao qual caminhamos sem a certeza de chegar mas com a certeza de que no caminho tudo o que fazemos é ganho.
Recuso a desilusão, o desânimo e o conformismo. Esses são os verdadeiros nomes da ameaça, pegando no que disse o poeta ainda ontem. Como já disse muitas vezes, só perdemos os combates em que não vamos à luta. Até ao árbitro apitar há jogo, e o prolongamento está perto. Só é preciso aceditar na força da nossa vontade de sermos livres, como no poema de Manuel Alegre de que se fez o hino da juventude, e que deixo em baixo.
Letra para um hino
É possível falar sem um nó na garganta
é possível amar sem que venham proibir
é possível correr sem que seja fugir.
Se tens vontade de cantar não tenhas medo: canta.
É possível andar sem olhar para o chão
é possível viver sem que seja de rastos.
Os teus olhos nasceram para olhar os astros
se te apetece dizer não grita comigo: não.
É possível viver de outro modo. É
possível transformares em arma a tua mão.
É possível o amor. É possível o pão.
É possível viver de pé.
Não te deixes murchar. Não deixes que te domem.
É possível viver sem fingir que se vive.
É possível ser homem.
É possível ser livre livre livre.
A campanha de Manuel Alegre teve sempre esta tónica: quem apareceu, apareceu com uma enorme vontade. Quem apareceu fê-lo por amor à liberdade, e não porque tinha de fazer o frete ao partido. Esta vontade que move montanhas através de gestos simples é uma força muito poderosa que dará resultados no Domingo. É nisso que acredito, contra os que desanimam e se conformam com a coroação há muito anunciada.
Acredito na passagem à segunda volta por muitas razões.
Porque há muita gente indecisa que pode a todo o momento descair para o nosso lado. Porque nesse momento solitário e secreto em que se entra na cabine de voto e pomos o papel à nossa frente muita coisa nos passa pela cabeça. Porque nesse momento em que ninguém está a ver somos integralmente livres. Porque aí não há confusão possível entre quem achamos que vai ganhar, quem achamos que pode ganhar e quem queremos que ganhe, e a nossa vontade é soberana. E por último, porque em última análise a capacidade de sonhar e rasgar horizontes vale mais do que a capacidade de fazer contas, a vontade de ganhar vale mais do que a vontade de mandar. Merece mais ganhar aquele que luta do que aquele que acha que o lugar lhe está destinado.
No domínio da possibilidade, as probabilidades estão repartidas: a vitória de Cavaco à primeira volta é provável, mas a segunda volta também o é. Não é só um delírio visionário, é uma possibilidade cada vez mais concreta.
Aos que me chamam utópico respondo que essa é a única maneira de que vale a pena viver a vida. A utopia não é o irrealizável, é o que ainda não está realizado. A utopia é esse horizonte em movimento em direcção ao qual caminhamos sem a certeza de chegar mas com a certeza de que no caminho tudo o que fazemos é ganho.
Recuso a desilusão, o desânimo e o conformismo. Esses são os verdadeiros nomes da ameaça, pegando no que disse o poeta ainda ontem. Como já disse muitas vezes, só perdemos os combates em que não vamos à luta. Até ao árbitro apitar há jogo, e o prolongamento está perto. Só é preciso aceditar na força da nossa vontade de sermos livres, como no poema de Manuel Alegre de que se fez o hino da juventude, e que deixo em baixo.
Letra para um hino
É possível falar sem um nó na garganta
é possível amar sem que venham proibir
é possível correr sem que seja fugir.
Se tens vontade de cantar não tenhas medo: canta.
É possível andar sem olhar para o chão
é possível viver sem que seja de rastos.
Os teus olhos nasceram para olhar os astros
se te apetece dizer não grita comigo: não.
É possível viver de outro modo. É
possível transformares em arma a tua mão.
É possível o amor. É possível o pão.
É possível viver de pé.
Não te deixes murchar. Não deixes que te domem.
É possível viver sem fingir que se vive.
É possível ser homem.
É possível ser livre livre livre.
sexta-feira, janeiro 13, 2006
Alegria, alegria!
Aos poucos a mensagem vai-se tornando contagiante. De boca em boca, passando a palavra aos amigos, roendo o pessimismo e o desânimo, enquanto Cavaco se afunda Manuel Alegre vai descolando de Soares, suportado pela multidão que não desiste, que acredita.
A alegria anda no ar.
A alegria anda no ar.
segunda-feira, janeiro 09, 2006
King Jackson
Há na obra de Peter Jackson um padrão de evolução muito semelhante à de Spielberg. A começar por, através de um blockbuster que lhe encheu os bolsos, ter conquistado o direito de fazer em cinema tudo o que quer e lhe apetece sem ter de se preocupar com dinheiro ou com agradar a alguém. E depois é o próprio modo de fazer cinema. Vemos um filme seu e a sensação que se tem antes de qualquer outra é a de que o homem se diverte imenso a fazer aquilo, e procura divertir os outros, sem preocupações académicas ou de respeito a qualquer cânone, mas sem qualquer superficialidade. Até na orgia de sangue que é Braindead não há futilidade no meio de toda a inverosimilhança que existe numa praga de canibalismo zombie propagada por contaminação de criptozoológica de ratazanas.
Os seus filmes são consistentes, têm conteúdo sem deixarem de ser lúdicos, mas não são propriamente do tipo de filme de Domingo à tarde, limitados a uma mera função de entertenimento despreocupado. Conseguir isso é, para mim, conseguir a quadratura do círculo.
Vai-se ver o King Kong e pelo preço do bilhete tem-se divertimento à velha maneira de Hollywood e momentos de sublime inspiração, como a relação que se cria entre a Bela e o Monstro, mais aprofundada do que na versão original e que culmina na coreografia do "beau-ti-full": contenção de recursos estilísticos e uma grande capacidade de síntese que está em dizer muito falando pouco.
O filme é rico em pormenores que não escapam à atenção de cinéfilo, incluídos com toda a subtileza.
O realizador Carl Denham, dado a delírios e megalomanias de génio, preocupado com a sua obra acima de tudo o resto, tem traços carregados de Orson Welles, com referência, en passant, a Cecil B. De Mille, o pai dos monumentais épicos da era de ouro de Hollywood.
A Fay a que se refere quando procura uma actriz para substituir a protagonista é Fay Wray, que fez o papel de Ann Darrow no filme original, e filme que se diz estar a fazer para a RKO é o próprio King Kong de 1933 (este é feito pela Universal).
No filme original há uma cena em que o capitão fala com Ann sobre o inconveniente de ter mulheres a bordo. No filme de Jackson, a cena é repescada para o filme dentro do filme, e é realizada por Carl Denham no barco, ainda em viagem.
E a minha preferida: o livro que o jovem grumete anda sempre a ler, "para se instruir", é Coração das Trevas, de Joseph Conrad, o livro que serviu de inspração a Apocalypse Now, e que trata de uma viagem pelo rio Congo acima, à procura de um louco (o monstro), e a caminho da loucura.
Apropriado, mais do que apropriado.
Os seus filmes são consistentes, têm conteúdo sem deixarem de ser lúdicos, mas não são propriamente do tipo de filme de Domingo à tarde, limitados a uma mera função de entertenimento despreocupado. Conseguir isso é, para mim, conseguir a quadratura do círculo.
Vai-se ver o King Kong e pelo preço do bilhete tem-se divertimento à velha maneira de Hollywood e momentos de sublime inspiração, como a relação que se cria entre a Bela e o Monstro, mais aprofundada do que na versão original e que culmina na coreografia do "beau-ti-full": contenção de recursos estilísticos e uma grande capacidade de síntese que está em dizer muito falando pouco.
O filme é rico em pormenores que não escapam à atenção de cinéfilo, incluídos com toda a subtileza.
O realizador Carl Denham, dado a delírios e megalomanias de génio, preocupado com a sua obra acima de tudo o resto, tem traços carregados de Orson Welles, com referência, en passant, a Cecil B. De Mille, o pai dos monumentais épicos da era de ouro de Hollywood.
A Fay a que se refere quando procura uma actriz para substituir a protagonista é Fay Wray, que fez o papel de Ann Darrow no filme original, e filme que se diz estar a fazer para a RKO é o próprio King Kong de 1933 (este é feito pela Universal).
No filme original há uma cena em que o capitão fala com Ann sobre o inconveniente de ter mulheres a bordo. No filme de Jackson, a cena é repescada para o filme dentro do filme, e é realizada por Carl Denham no barco, ainda em viagem.
E a minha preferida: o livro que o jovem grumete anda sempre a ler, "para se instruir", é Coração das Trevas, de Joseph Conrad, o livro que serviu de inspração a Apocalypse Now, e que trata de uma viagem pelo rio Congo acima, à procura de um louco (o monstro), e a caminho da loucura.
Apropriado, mais do que apropriado.
sábado, dezembro 24, 2005
História Antiga
Era uma vez, lá na Judeia, um rei.
Feio bicho, de resto:
Uma cara de burro sem cabresto
E duas grandes tranças.
A gente olhava, reparava, e via
Que naquela figura não havia
Olhos de quem gosta de crianças.
E, na verdade, assim acontecia.
Porque um dia,
O malvado,
Só por ter o poder de quem é rei
Por não ter coração,
Sem mais nem menos,
Mandou matar quantos eram pequenos
Nas cidades e aldeias da Nação.
Mas, por acaso ou milagre, aconteceu
Que, num burrinho pela areia fora,
Fugiu
Daquelas mãos de sangue um pequenito
Que o vivo sol da vida acarinhou;
E bastou
Esse palmo de sonho
Para encher este mundo de alegria;
Para crescer, ser Deus;
E meter no inferno o tal das tranças,
Só porque não gostava de crianças.
Miguel Torga
quarta-feira, dezembro 21, 2005
O sol já volta
Hoje é o Solstício de Inverno, o que significa que o hemisfério norte está mais longe do sol do que em qualquer outra altura do ano. O que significa que a noite de hoje é a mais longa de todo o ano (que o digam os nórdicos). O que significa também que começa hoje - e só hoje - o Inverno.
Os antigos romanos festejavam o sol invictus, o sol invencível, uns dias depois, a 25, quando o sol se reerguia para começar a a crescer de poder de dia para dia. Os cristãos aproveitariam essa festividade pagã para fazer passar a festa da natividade de Cristo, que assim ficou convencionada ter ocorrido a 25 de Dezembro. Foi assim, às cavalitas do paganismo, que nasceu o Natal que hoje conhecemos.
Aproveitemos a noite. A partir de amanhã os dias serão maiores, mas só até à próxima navegação celeste extrema, que ocorrerá em Junho.
Os antigos romanos festejavam o sol invictus, o sol invencível, uns dias depois, a 25, quando o sol se reerguia para começar a a crescer de poder de dia para dia. Os cristãos aproveitariam essa festividade pagã para fazer passar a festa da natividade de Cristo, que assim ficou convencionada ter ocorrido a 25 de Dezembro. Foi assim, às cavalitas do paganismo, que nasceu o Natal que hoje conhecemos.
Aproveitemos a noite. A partir de amanhã os dias serão maiores, mas só até à próxima navegação celeste extrema, que ocorrerá em Junho.
quarta-feira, dezembro 14, 2005
A música que se houve por toda a vida
Há coisas de que se gosta porque nos enchem os sentidos, há outras de que gostamos porque a beleza está na sua simplicidade desarmante, e, apesar de simples, são de uma riqueza preenchedora.
Bob Dylan mostrou que não é preciso ter uma grande voz para cantar bem. A bem dizer, a voz não é o que mais interessa na música de Bob Dylan, mas sim a sua capacidade de pôr muita coisa numa forma simples. Não são precisos arranjos nem grandes arrumações: a beleza está toda na simplicidade, ou, como diz uma amiga minha, as melhores essências estão nos frascos mais pequenos.
Com uma produção assim, Dylan chegou a referência incontornável da música, não só da folk e do rock, mas de uma ideia universal de música. Fez-se homenzinho a ouvir a prodigiosa música americana das raízes, como o folk e o blues. Saiu Robert Zimmerman do seu Minnesota natal numa mota com destino a Chicago mas a meio decidiu cortar caminho para Nova Iorque, porque aí estava o seu ídolo Woody Gunthrie internado no Brooklyn State Hospital com uma doença incapacitante e Bob queria visitar o mestre. O testemunho foi passado.
Aí fez-se Bob Dylan, em homenagem ao poeta Dylan Thomas, e o mundo ganhou mais um.
Os três álbuns que editou entre 1963 e 1965 foram logo considerados dos mais importantes e influentes da música americana
Às vezes dá-me para ouvir algumas músicas até à exaustão. A última foi o Hallelujah de Leonard Cohen, na versão de Rufus Wainwright. Agora é Just Like a Woman, de Dylan. Veio-me porque o vi interpretá-la num DVD do Concerto pelo Bangladesh promovido em 1971 pelo ex-Beatle George Harrison, em casa de um amigo meu assim celebrava o se 51.º aniversário, e nisto de música ensina a muita gente. E com as músicas em estilo de prece de Bob Dylan, ainda hoje cheias de actualidade, também se aprende muito. Sobre tudo.
Bob Dylan mostrou que não é preciso ter uma grande voz para cantar bem. A bem dizer, a voz não é o que mais interessa na música de Bob Dylan, mas sim a sua capacidade de pôr muita coisa numa forma simples. Não são precisos arranjos nem grandes arrumações: a beleza está toda na simplicidade, ou, como diz uma amiga minha, as melhores essências estão nos frascos mais pequenos.
Com uma produção assim, Dylan chegou a referência incontornável da música, não só da folk e do rock, mas de uma ideia universal de música. Fez-se homenzinho a ouvir a prodigiosa música americana das raízes, como o folk e o blues. Saiu Robert Zimmerman do seu Minnesota natal numa mota com destino a Chicago mas a meio decidiu cortar caminho para Nova Iorque, porque aí estava o seu ídolo Woody Gunthrie internado no Brooklyn State Hospital com uma doença incapacitante e Bob queria visitar o mestre. O testemunho foi passado.
Aí fez-se Bob Dylan, em homenagem ao poeta Dylan Thomas, e o mundo ganhou mais um.
Os três álbuns que editou entre 1963 e 1965 foram logo considerados dos mais importantes e influentes da música americana
Às vezes dá-me para ouvir algumas músicas até à exaustão. A última foi o Hallelujah de Leonard Cohen, na versão de Rufus Wainwright. Agora é Just Like a Woman, de Dylan. Veio-me porque o vi interpretá-la num DVD do Concerto pelo Bangladesh promovido em 1971 pelo ex-Beatle George Harrison, em casa de um amigo meu assim celebrava o se 51.º aniversário, e nisto de música ensina a muita gente. E com as músicas em estilo de prece de Bob Dylan, ainda hoje cheias de actualidade, também se aprende muito. Sobre tudo.
sexta-feira, dezembro 09, 2005
9444
Hoje a Democracia em Portugal foi prestigiada com a entrega das assinaturas dos cidadãos eleitores que propuseram Manuel Alegre para candidato a Presidente da República.
O poder de mexer com a política não está só nas mãos de alguns - está na mão de todos nós que fizemos uso da nossa liberdade individual não comprometida, que fizemos avançar mais um pouco esta ideia de país que não descansa e não desiste.
Obrigado aos 51 cidadãos que aceitaram o meu convite para usarem este gesto simples mas cheio de significado. Sem vocês não eramos 9444.
O poder de mexer com a política não está só nas mãos de alguns - está na mão de todos nós que fizemos uso da nossa liberdade individual não comprometida, que fizemos avançar mais um pouco esta ideia de país que não descansa e não desiste.
Obrigado aos 51 cidadãos que aceitaram o meu convite para usarem este gesto simples mas cheio de significado. Sem vocês não eramos 9444.
quarta-feira, dezembro 07, 2005
sábado, novembro 26, 2005
O Poder está na palavra
Já o escrevi aqui e aqui : a série The West Wing/Os Homens do Presidente é das melhores coisas que se fizeram em televisão. Na altura em que escrevi, o AXN ia passar o episódio que encerrava a segunda série, num ponto em que o Presidente se debatia com a decisão de se recandidatar ou não, depois de ter anunciado ao público que sofria de esclerose múltipla, uma doença progressivamente incapacitante. O problema não era tanto ter a doença, era nunca tê-la revelado ao público americano, nem aos seus colaboradores próximos.
O escândalo, de dimensão semelhante ao escândalo Monica Lewinski, embora com contornos edificantes, fez com que Jed Bartlet fosse pressionado a anunciar que não se recandidataria, apesar de o Partido Democrático, ao qual pertence, querer a sua demissão para que o Vice-Presidente assumisse o cargo e lançasse a sua candidatura - tudo para em nome do superior interesse do partido. Tudo isto surge numa altura em que o Presidente vê-se a braços com um golpe de Estado no Haiti e com a morte num acidente de viação da sua amiga e secretária pessoal, que o conhecia desde que era um jovem estudante no colégio que o pai dirigia e para quem ela trabalhava.
Apesar disso, Bartlet decide - à última da hora e quando tudo indicava o contrário - recandidatar-se, e é pel a forma como tudo se sucede e é contado que interessa ver o episódio Two Cathedrals.
Não pude deixar de obter os dois episódios seguintes para matar a curiosidade. E o ponto da situação é este: Bartlet tem problemas conjugais, por ter anunciado a recandidatura, e com a sua equipa, por que nunca lhes contou da doença. Para resolver a situação é chamada uma equipa de estrategas políticos de créditos firmados, o que acarreta inevitáveis atritos com os membros do gabinete presidencial. A equipa prepara exaustivamente o discurso a apresentar numa cerimónia pensada ao milímetro para anunciar a recandidatura, e uma das questões é: deve o presidente pedir desculpa ou não, já que ainda não o fez?
Momentos antes da cerimónia ainda se discute com um dos estrategas que palavras escolher. E é então que aparece um momento de inspirada retórica política, que passo a transcrever, e que demonstra o poder da palavra na política:
- "Torpor" é uma palvra que muita gente não sabe o que significa. - Significa "apatia", "adormecimento". - Sim mas muita gente não sabe isso, e se não sabem...
(o Presidente entra na sala e interrompe a conversa)
- ... se não sabem o significado, que procurem saber. O nosso trabalho não é apelar ao mínimo denominador comum entre as pessoas, mas sim aumentá-lo. Se eu quero ser um presidente educativo, será bom não esquecer que tenho educação. Churchill e Roosevelt foram homens sérios que usaram grandes palavras para grandes objectivos.
(o Presidente dirige-se à sua equipa)
- Parece que nunca cheguei a pedir desculpa. Mas peço. Peço desculpa pelos [incómodos causados pelos] advogados, pela comunicação social, pelo medo. Estes tipos são bons e querem ganhar, tal como nós. A única coisa que queremos mais é ter razão. Será que conseguimos as duas coisas?
Há uma história nova para escrever, e nós vamos escrevê-la: pode-se se ganhar com uma campanha inteligente e disciplinada. Se nunca dissermos nada, nada que nos traga problemas, nada que possa ser uma gaffe, nada que possa indicar que pensamos o que não devemos, nada que indique que pensamos... então isso não é digno de nós, nem é digno de uma grande nação.
Parece-me muito a propósito.
O escândalo, de dimensão semelhante ao escândalo Monica Lewinski, embora com contornos edificantes, fez com que Jed Bartlet fosse pressionado a anunciar que não se recandidataria, apesar de o Partido Democrático, ao qual pertence, querer a sua demissão para que o Vice-Presidente assumisse o cargo e lançasse a sua candidatura - tudo para em nome do superior interesse do partido. Tudo isto surge numa altura em que o Presidente vê-se a braços com um golpe de Estado no Haiti e com a morte num acidente de viação da sua amiga e secretária pessoal, que o conhecia desde que era um jovem estudante no colégio que o pai dirigia e para quem ela trabalhava.
Apesar disso, Bartlet decide - à última da hora e quando tudo indicava o contrário - recandidatar-se, e é pel a forma como tudo se sucede e é contado que interessa ver o episódio Two Cathedrals.
Não pude deixar de obter os dois episódios seguintes para matar a curiosidade. E o ponto da situação é este: Bartlet tem problemas conjugais, por ter anunciado a recandidatura, e com a sua equipa, por que nunca lhes contou da doença. Para resolver a situação é chamada uma equipa de estrategas políticos de créditos firmados, o que acarreta inevitáveis atritos com os membros do gabinete presidencial. A equipa prepara exaustivamente o discurso a apresentar numa cerimónia pensada ao milímetro para anunciar a recandidatura, e uma das questões é: deve o presidente pedir desculpa ou não, já que ainda não o fez?
Momentos antes da cerimónia ainda se discute com um dos estrategas que palavras escolher. E é então que aparece um momento de inspirada retórica política, que passo a transcrever, e que demonstra o poder da palavra na política:
- "Torpor" é uma palvra que muita gente não sabe o que significa. - Significa "apatia", "adormecimento". - Sim mas muita gente não sabe isso, e se não sabem...
(o Presidente entra na sala e interrompe a conversa)
- ... se não sabem o significado, que procurem saber. O nosso trabalho não é apelar ao mínimo denominador comum entre as pessoas, mas sim aumentá-lo. Se eu quero ser um presidente educativo, será bom não esquecer que tenho educação. Churchill e Roosevelt foram homens sérios que usaram grandes palavras para grandes objectivos.
(o Presidente dirige-se à sua equipa)
- Parece que nunca cheguei a pedir desculpa. Mas peço. Peço desculpa pelos [incómodos causados pelos] advogados, pela comunicação social, pelo medo. Estes tipos são bons e querem ganhar, tal como nós. A única coisa que queremos mais é ter razão. Será que conseguimos as duas coisas?
Há uma história nova para escrever, e nós vamos escrevê-la: pode-se se ganhar com uma campanha inteligente e disciplinada. Se nunca dissermos nada, nada que nos traga problemas, nada que possa ser uma gaffe, nada que possa indicar que pensamos o que não devemos, nada que indique que pensamos... então isso não é digno de nós, nem é digno de uma grande nação.
Parece-me muito a propósito.
sexta-feira, novembro 25, 2005
Ufa...
Lembrar-me eu que um dia saí da faculdade a pensar que advogado é que era, que no meio da angústia de dar o passo em frente sem saber se o chão me falhava aquela até podia ser a opção de futuro.
Sorte foi não ter entrado para a faculdade com esse objectivo como único, e fazer Direito porque que outra opção me poderia modelar e formar e preparar da forma que eu queria que não essa? Assim não foi desilusão, só chatice.
Ainda se o trabalho de fazer a justiça fosse uma missão confiada a nós como aos médicos se confiam as vidas, e o apoio judiciário não fosse só um forma de reduzir a vergonha do Estado por nada funcionar como deve, serviço pago à peça, a modos que um frete para se cumprir a Constituição.
Não basta ter jeito e gostar de retórica. É preciso querer ganhar a vida a fazer aquilo.
Bom seria uma coisa assim para o administrativo, de serviço público, com o cidadão à espreita.
Agora sim, está bem.
Sorte foi não ter entrado para a faculdade com esse objectivo como único, e fazer Direito porque que outra opção me poderia modelar e formar e preparar da forma que eu queria que não essa? Assim não foi desilusão, só chatice.
Ainda se o trabalho de fazer a justiça fosse uma missão confiada a nós como aos médicos se confiam as vidas, e o apoio judiciário não fosse só um forma de reduzir a vergonha do Estado por nada funcionar como deve, serviço pago à peça, a modos que um frete para se cumprir a Constituição.
Não basta ter jeito e gostar de retórica. É preciso querer ganhar a vida a fazer aquilo.
Bom seria uma coisa assim para o administrativo, de serviço público, com o cidadão à espreita.
Agora sim, está bem.
segunda-feira, novembro 21, 2005
sexta-feira, novembro 18, 2005
A felicidade nas pequenas coisas
Apresento a mais recente paixão da minha vida: uma bola de rugby Kipsta RG 300 que comprei ontem na Decathlon por uns míseros seis euritos e noventa e cinco cêntimos, made in India e provavelmente incorporando trabalho infantil, mas isso agora não interessa nada.
Se o sonho de menino do Tony Carreira era ser cantor popular, o meu passava por muitas coisas, entre as quais ser mergulhador, jogar no Benfica e ter uma quinta onde criasse vacas. Entre as pequenas coisas que me fariam feliz estava ter uma bola de rugby a sério.
Começou quando um dia fui com a família à Feira da Agricultura em Santarém e havia uma barraquita (hoje seria um stand comercial) a oferecer uma bola de rugby (na altura era reiguebi) a quem comprasse uma palete de Capri-Sonne.
Eram famosíssimas as bolas de futebol oferecidas pela Capri-Sonne, ícone do património visual e gustativo da minha geração, feitas de um plástico rasca perfeito para rebentar nas futeboladas que se jogavam na rua, apropriadas porque se podia disparar directamente para o vidro de uma janela sem o partir, o que evitava os correspondentes ralhete e palmada.
Mas uma bola de rugby era uma coisa muuuuito à frente. Ninguém tinha uma.
A minha vida social teve um temporário sobressalto, enquanto durou o perfume da novidade. Mas a minha bola de rugby azul a dizer Capri Sonne acompanhou-me sempre até há bem pouco tempo, quando deixei de a ver, talvez desaparecida num dos frequentes surtos de febre arrumadora de que sofre o meu pai, aos quais mais propriamente poderia chamar exterminações de património.
Desde então que sonhava ter o meu dinheiro para comprar a coisa a sério. Ontem calhou.
Passo grandes bocados a mandá-la contra a parede e a apanhá-la, assim, só pelo gozo da coisa.
Agora, bom, bom, era que o Koeman me convocasse para jogar contra o Manchester.
Se o sonho de menino do Tony Carreira era ser cantor popular, o meu passava por muitas coisas, entre as quais ser mergulhador, jogar no Benfica e ter uma quinta onde criasse vacas. Entre as pequenas coisas que me fariam feliz estava ter uma bola de rugby a sério.
Começou quando um dia fui com a família à Feira da Agricultura em Santarém e havia uma barraquita (hoje seria um stand comercial) a oferecer uma bola de rugby (na altura era reiguebi) a quem comprasse uma palete de Capri-Sonne.
Eram famosíssimas as bolas de futebol oferecidas pela Capri-Sonne, ícone do património visual e gustativo da minha geração, feitas de um plástico rasca perfeito para rebentar nas futeboladas que se jogavam na rua, apropriadas porque se podia disparar directamente para o vidro de uma janela sem o partir, o que evitava os correspondentes ralhete e palmada.
Mas uma bola de rugby era uma coisa muuuuito à frente. Ninguém tinha uma.
A minha vida social teve um temporário sobressalto, enquanto durou o perfume da novidade. Mas a minha bola de rugby azul a dizer Capri Sonne acompanhou-me sempre até há bem pouco tempo, quando deixei de a ver, talvez desaparecida num dos frequentes surtos de febre arrumadora de que sofre o meu pai, aos quais mais propriamente poderia chamar exterminações de património.
Desde então que sonhava ter o meu dinheiro para comprar a coisa a sério. Ontem calhou.
Passo grandes bocados a mandá-la contra a parede e a apanhá-la, assim, só pelo gozo da coisa.
Agora, bom, bom, era que o Koeman me convocasse para jogar contra o Manchester.
sexta-feira, novembro 11, 2005
A 'nha terra é linda!
Poucos habitantes da cidade perceberão o encanto de viver numa terra onde se trata por tu o homem do café, ou se cumprimenta a senhora da mercearia quando a vemos na fila para o médico no posto clínico, ou se desatina com a funcionária da Junta quando andamos a recolher assinaturas para um tipo que quer ser presidente da República, apenas para acabar tudo num bem disposto "só tu para me moeres o juízo", ou se pede uns garrafões de água ao vizinho que tem um furo porque acabou a água da companhia.
Mas na cidade ainda há alguns focos de resistência à agressão da paisagem urbana ao espírito. Veja-se este trecho retirado da crónica de hoje do cityslicker Miguel Sousa Tavares no Público, sobre o seu Bairro de Campo de Ourique:
«O melhor exemplo deste espírito de liberdade e tolerância mútua que aqui presenciei é um exemplo muito politicamente incorrecto, ocorrido manhã cedo, no café onde sempre tomo o pequeno-almoço. Uma senhora, cliente habitual, pediu um café e acendeu um cigarro. Nessa altura, um sujeito que eu nunca ali tinha visto e nunca voltei a ver, empertigou-se todo e, rico de novos conhecimentos adquiridos, interpelou-a "Minha senhora, o cheiro do seu cigarro está-me a incomodar!" E ela sem sequer se voltar, soltou de lado, mas alto e bom som: "Olhe, também o seu cheiro me está a incomodar, mas eu não lhe ia dizer nada." E o intruso saiu, de rabo entre as pernas e perante os sorrisos cúmplices dos habitués (oh, eu sei, um bando de selvagens!)»
quarta-feira, novembro 09, 2005
Dos heróis
Em qualquer cultura haverá de forma mais popular ou erudita o culto dos heróis. A antiguidade clássica deixou-nos Aquiles, Ulisses, Hércules, Jasão e Teseu. Sindbad chegou-nos por contágio da Arábia. A cavalaria medieval deu-nos o estereótipo do novo herói com o rei Artur e a Távola Redonda, e Cervantes explorou exaustivamente o conceito com D. Quixote (a ele chegarei um dia).
O século XX recuperou o papel do sobrenatural e apresentou-nos os super-heróis da banda desenhada, objectos acidentais de um cientifismo delirante, em que para grandes males só mesmo super remédios.
Deste tipo de heróis, Batman é o meu preferido (lembro-me sempre do Batman na hora de vestir o fato de surf).
Batman nunca teve essas mariquices de super-poderes que fazem do trabalho dos outros super-heróis um passeio na avenida. E no entanto parece um verdadeiro super-homem. Bruce Wayne percebe que o que importa não é a pessoa por trás do fato, mas a ideia que os outros fazem dela - o poder está no símbolo. Enquanto que os outros super-heróis andam às voltas para salvar o mundo, em Batman isso apenas é um aspecto marginal da história: o que realmente interessa é a dimensão humana do mito; não o que os outros vêem naquilo que ele faz, mas aquilo que nós, espectadores da histórias, vemos no homem.
A história de Batman teve a sorte de ser pela primeira vez abordada em cinema pelo poeta que é Tim Burton. Com o Homem-Aranha o esforço nunca foi muito sério, e o resultado foi patético - mas a verdade é que também a personagem não se presta a isso.
Em Batman Begins, Christopher Nolan baralha e volta a dar, conta a história de maneira diferente, mas muito complementar à leitura de Tim Burton, embora o que se ganhe em credibilidade se perca em poética. Explicar a personagem, esmiuçar as linhas com que ela se cose, tem o risco de a desfazer, como se desmontássemos um aparelho: podemos ficar a perceber como funciona, mas também podemos não conseguir que ele volte a ser o que era para nós (para começar, porque pode não voltar a funcionar).
Eu gosto daquele Batman, o Batman que também ganha cicatrizes e nódoas negras. Aquele é o Batman que fica para a história, não o Batman de Joel Schumacher, não o Batman dos anos 60, da TV.
Batman é um grande herói porque é humano como nós. Para heróis sobrenaturais prefiro o Thermoman, na SIC Comédia ou na 2:.
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